Pessoa introvertida

Um texto sobre tipologia, introversão e extroversão.

PSICOLOGIA PROFUNDA

por Thales Augusto

10/15/20257 min read

É comum usarmos termos como introvertido ou extrovertido para dizer como as pessoas são. "Fulano fala muito e sempre está socializando pra lá e para cá." Ele é extrovertido. "Beltrano fica cabisbaixo, não fala com ninguém e morre de medo de socializar." Ele é introvertido. Imagina a confusão de quem se depara com esses termos dentro da psicologia profunda e acha que alguém está sendo xingado de introvertido ou taxado como bon vivant ao ser chamado de extrovertido. O fato é que são as mesmas palavras para dizerem de coisas diferentes.

Dentro da psicologia, portanto, tais termos fazem parte do conjunto dos tais "termos técnicos". Existem para atribuir uma tipologia, ou seja, tipos ou perfis psicológicos. E o que isto quer dizer? Quer dizer que cada um tem uma psiquê (uma mente) e que existem características gerais que são comuns para alguns tipos e grupos de pessoas (ou mentes). E isso é amplamente usado para contextos de massa, como quando fazemos uma entrevista de emprego nada haver com aquela pessoa bem relax (na maioria das vezes nem tanto), que fazem perguntas como: "se você pudesse ser um animal, qual seria?" Ou quando vemos alguém vendendo algum curso, workshop, palestra, ou livro, dizendo saber qual é o seu perfil psicológico ou lhe ensinando como identificar o dos outros, para ser uma mãe melhor, um pai melhor, um chefe melhor, um descolado bonitão da coisa toda, ou seja lá qual groselha for.

A coisa piora quando alguém usa isso pra de fato dizer como lidar com a vida dos outros ou com a saúde mental. Ora, não me entenda mal. Eu não sou do clube dos que adoram dizer que os outros não podem estudar ou usar conceitos psicológicos para viver, vender, interagir socialmente, ou falar asneiras. Eu deixo isso para os tirânicozinhos de plantão, que morrem de vontade de terem uma Auschwitz para chamar de suas, ao mesmo tempo em que postam em suas redes sociais que são super inclusivos e prafrentex. O caso é que usar a tipologia pro contexto de psicologia é como dirigir em um Fusca caindo aos pedaços enquanto tem uma Ferrari na garagem. O Fusca é bem legal, e bem bonito na minha opinião. Sem dúvida, um bem arrumado chama atenção e faz muito bem o papel de levar daqui até ali. Mas convenhamos: tem uma Ferrari na garagem.

Mas por que então eu vim falar da tipologia aqui? Porque é bonita, legal e faz seu papel. E também porque me deu vontade. Sem contar que é bom falar sobre ela dentro do seu lugar, que pra início de conversa é muito bem usada quando em contexto de massa (para várias pessoas), pois de fato representa bem um perfil psicológico e, portanto, grupos de pessoas.

O ponto chave da tipologia de extrovertido ou introvertido é entender que ela nasce da dinâmica psicológica. Que é aquela velha história: nossos pensamentos nascem com o objetivo de virem para o mundo; eles se articulam na nossa mente e se conectam com as coisas lá fora (o mundo real). Esta é a dinâmica, o movimento. E de um modo muito simples, o tipo introvertido tenta esvaziar os objetos para se manifestar e o extrovertido tenta se conectar de modo superficial com os objetos, mudando de objeto em objeto, para não revelar a si mesmo. Simples, mas nem tanto, né? Deixa eu explicar isso melhor.

Essa dinâmica, o movimento do pensamento de dentro de nós para fora, por exemplo, tem alguns agentes. Ou seja, algumas figuras: tem você, quem pensa; o pensamento, que contém a ideia pensada; e o objeto. O você pode ser o que (olha os termos técnicos aí) chamamos de eu. O objeto é o seu alvo. Isto, o objeto, pode ser tudo e qualquer coisa. Pode ser a pessoa com quem você está interagindo. Pode ser literalmente um objeto, como um copo, ou uma caneta, ou qualquer outra coisa. Bem como uma situação. E é normal entre esses três agentes (eu, pensamento e objeto) ter algum destaque de vez em quando. Ora queremos dar ênfase em nós, o eu. Ora queremos dar ênfase no objeto, o outro. E aí a coisa fica mais simples. O introvertido tem a tendência maior de dar ênfase em si e o extrovertido no outro.

Isso quer dizer que um só faz uma coisa e o outro só faz a outra? Não. Todos nós temos as duas características. O que faz de um ser um tipo ou do outro é a predominância.

E isso quer dizer que o introvertido só pensa em si e tá nem aí para os outros? Não, isso tem haver com contato psicológico.

Imagina você ter uma vontade qualquer. Faz um grande planejamento pensando nisso. Se organiza todo e faz um grande movimento na sua vida. E na hora do vamos ver, deixa a coisa para lá, descontinua e faz de tudo (tudo mesmo), de menos aquilo que você mesmo colocou como objetivo para você. Se identificou? Pois é. Isso é a coisa mais normal do mundo e todos nós, uns mais e outros menos, fazemos isso. Mas tem momentos que sentimos tanta vergonha de nós mesmos por isso, que não suportamos nem lembrar desse plano e que um dia tivemos a vontade de fazer tal coisa. Se alguém insinua algo sobre isso…ai ai! Viramos uma fera. É justamente nessa vergonha de nós mesmo que rejeitamos olhar para qualquer elemento mental que está conectado com isso tudo. Sejam lembranças, pensamento, o que for. E isso tudo faz parte desse universo psicológico, interno, que aqui estou generalizando como (termo técnico) eu.

Pois é. Essa vontade de evitar essa parte interna a todo custo é uma manifestação tipicamente extrovertida. E o que fazemos quando nos conectamos com um e depois outro e mais outro, é justamente evitar ao máximo olhar para esse mundo interno. Quer dizer que o extrovertido então é ruim e não olha para si? Não, apenas que o movimento (a dinâmica) é mais ou menos essa e elevar um exemplo vergonhoso, que nos leva à fuga de evitar esse mundo interno, faz entender a dinâmica da extroversão de um jeito mais fácil. O oposto, portanto, fica mais evidente. O introvertido procura mais o mundo interno. Por isso que se conectar com muitos objetos não é negócio para o introvertido.

E é entendendo tais dinâmicas, que dá pra entender alguns padrões de comportamento geral. É fácil entender como de fato um extrovertido pode sim fugir de si o tempo todo e não ter compromisso com nada e com ninguém, se não usar sua dinâmica com diligência. Como um extrovertido pode ser sumariamente estressado, se forçarem ele a ficar sempre conectado com um objeto apenas em sua vida (como uma função de trabalho que interage apenas com uma coisa no dia a dia). Como um introvertido pode, por outro lado, fugir de tudo e todos e se conectar com ninguém, ao ponto de até desenvolver algum tipo de fobia social, merecendo o jargão (e não o termo técnico) de introvertido. E os exemplos desses exageros são muitos.

Para Jung, por exemplo, o tipo introvertido pode procurar retirar o valor dos objetos ao seu redor. É um processo adaptativo no qual o sujeito impõem visões negativas, críticas pontuais que abalam o objeto ou até mesmo frieza no trato. O objetivo é justamente o enfraquecimento dos objetos ao seu redor, forçando que sejam afastados para que o sujeito possa sobreviver de acordo com seus próprios aspectos subjetivos (ou psicológicos, ou internos).

Ainda sobre o tipo introvertido, pode-se notar outra característica como a de diminuir a realidade do objeto, afastando todas as ideias da realidade que o cercam (cercam o objeto). Isto pode levar o introvertido a criar dentro de si as suas próprias percepções. O que em si não é um problema, pois é natural que formemos dentro de nós essas próprias percepções, mesmo que atribuindo-as aos outros. Porém, seu exagero leva à um acúmulo de noção subjetiva e passa a julgar ou atuar não de acordo com o total das percepções vindas do mundo real, mas sim com seus aspectos gerados pela própria pessoa que pensa sobre os outros. De forma que cria uma imposição ao objeto de uma realidade fictícia. Fica ao encargo do sujeito, por tanto, uma tentativa constante de mudar a realidade das coisas, o que poderia ser caracterizado como neurose obsessiva. O que lembra nossos amiguinhos donos de alguma pequena Auschwitz. A consequência inevitável é o esgotamento do tirânico (no caso aqui um introvertido sem controle de seus próprios aspectos).

O ponto chave dessa dinâmica, entretanto, não é entender unicamente o comportamento consciente do sujeito, portanto aquilo que é nítido, mas também o seu oposto. Segundo a tipologia junguiana, a classificação de tipo é atribuída à manifestação do sujeito e, portanto, aquilo que lhe é consciente. Mas a constituição humana não deixa de integrar sua totalidade e isto é relativo a outro termozinho técnico que é a oposição dos contrários, ou a completude psicológica. Em outras palavras, quer dizer que aquela parte que não vemos nos outros (chamada de inconsciente), por sua vez, possui características do tipo oposto. Ou seja, uma pessoa do tipo introvertida tem um inconsciente extrovertido. E entender isso é o início do princípio do começo para tecer remédios para exageros como os mencionados até aqui.

Então veja, caro leitor, como a tipologia pode ser usada para entender certas características gerais de uma pessoa. Como isso é bom, de fato, para conduzir pessoas e aproveitar potências de cada um. De como, dentro da psicologia junguiana (portanto sobre os tipos extrovertido e introvertido), isso tem haver com a dinâmica psicológica. E que tais tipos não só tem suas características, que podem ser aproveitadas como potência, bem como perigos de vícios característicos. Que por sua vez podem ser superados entendendo seu extremo oposto "lá no inconsciente". Imagina então, como o motor de um Fusca (a tipologia) é complicadíssimo. Começar a se aprofundar e falar do seu oposto agora, é como se começássemos a montar um motor de Ferrari.

Por isso, pronto. Satisfiz minha vontade de falar um pouco de tipologia aqui e você satisfez sua vontade de ler um pouco sobre o que é introvertido. Estamos de parabéns.